Storytelling como um antídoto para a cultura da superficialidade
*Por Gustavo Teitelbaum
Vivemos tempos curiosos. Ao mesmo tempo que acompanhamos os rápidos avanços das plataformas digitais, convivemos com um sentimento cada vez mais inquietante: o tédio. Sim, aquilo que parecia reservado para momentos de ócio, agora é consequência da nossa interação com as redes sociais.
Uma pesquisa publicada recentemente pela American Psychological Association (APA), Tam & Inzlicht (2024) concluiu que o comportamento de digital switching – essa troca frenética e quase compulsiva entre conteúdos – não apenas reduz a nossa atenção, como também amplifica nossa insatisfação. É um ciclo vicioso que, além de transformar a experiência individual de consumo, torna cada vez mais complexa a comunicação interna nas organizações.
“[…] como engajar em meio a essa cultura da superficialidade?”
Esse fenômeno expõe uma das grandes questões da comunicação no ambiente digital: como, em meio a tanto estímulo, capturar e manter a atenção das pessoas? Com o domínio de vídeos curtos em feeds infinitos, a superficialidade parece ter virado praxe de mercado. Estamos nos acostumando a consumir conteúdo como quem passa os olhos por um catálogo da Netflix tão cheio de opções que dá vontade de desistir antes de começar a assistir um filme. Para empresas, isso cria um dilema crucial: como engajar em meio a essa cultura da superficialidade?
Para isso, o storytelling pode ser um antídoto poderoso. Em vez de competir com o mar de estímulos, a técnica narrativa propõe outra abordagem: promover uma experiência mais profunda e reflexiva ao contar histórias que capturam e mantêm a atenção, desafiando o digital switching e a necessidade dos times de comunicação estarem sempre correndo atrás do último meme. Este artigo explora como o storytelling pode ser a chave para restaurar o engajamento na comunicação interna.
A era da desatenção e o desafio do scroll infinito
Os algoritmos das plataformas digitais nos oferecem ininterruptamente conteúdos rápidos e rasos, apresentados através em um feed infinito. Isso acabou gerando o que podemos denominar de “cultura da superficialidade”, em que o excesso de informação cria uma necessidade constante de consumir conteúdos curtos. Em seu livro Attention Span, Gloria Mark (2023) afirma que a atenção das pessoas está cada vez mais fragmentada, com dificuldade de concentração especialmente nos ambientes digitais. Em um mundo onde a próxima distração parece estar sempre a um clique de distância, manter o foco em algo mais profundo se torna uma tarefa cada vez mais complexa.
Com a predominância de vídeos que duram segundos, as plataformas digitais desafiam nossa capacidade de reflexão. Esses formatos curtos criam um ambiente onde a atenção raramente se fixa, saltando de um estímulo para o outro sem parecer se comprometer. Isso não apenas afeta a forma como as pessoas consomem conteúdo, mas também impacta a nossa capacidade crítica.
Para as empresas, isso representa um desafio substancial na comunicação interna. As mensagens importantes, aquelas que exigem reflexão e ação, costumam se perder em meio a tanta informação desnecessária. Além disso, a necessidade de competir com o volume avassalador de conteúdo digital pode levar a uma comunicação rasa e, muitas vezes, ineficaz, que está muito pautada no que as redes estão falando e pouco na necessidade dos colaboradores.
Storytelling como antídoto para a superficialidade
Segundo Brokington et al. (2021), o storytelling é uma característica distintiva dos seres humanos, que desempenhou um papel fundamental na nossa capacidade de criar vínculos e navegar por situações sociais desafiadoras ao longo da nossa evolução. Ao contrário das mensagens breves e desconectadas, uma boa história tem o poder de envolver, de capturar a atenção em um nível emocional e de manter a audiência investida.
Uma série de estudos, como o de Baumbach (2019) e Friedman (2014), demonstram que narrativas estruturadas facilitam a compreensão e a retenção de informações, mesmo em um contexto em que a atenção é um bem escasso. Quando todos os elementos do storytelling estão bem-organizados, fica mais fácil da audiência prestar a atenção e se envolver de mente e alma com o seu conteúdo (Boris, Lani, 2018). Assim, o storytelling surge como uma resposta a essa maré de superficialidade.
O poder das narrativas vai além de simplesmente desacelerar o consumo de conteúdo. Através das técnicas de storytelling, é possível criar uma jornada que, ao se desenrolar, tem a capacidade de engajar o espectador. Assim, as empresas que conseguem contar boas histórias têm a oportunidade de, além de capturar e manter a atenção dos colaboradores, promover um conteúdo que seja informativo e capacite quem o consome.
Outro aspecto vital do storytelling é a conexão emocional que ele promove (Baumbach, 2019). Quando os colaboradores se veem refletidos em uma história, quando sentem que fazem parte dela, a atenção e o engajamento são naturalmente ampliados.
Aplicando o storytelling na comunicação interna
Para que o storytelling funcione de forma eficaz na comunicação interna, ele precisa ressoar com os colaboradores, conectando-se às suas experiências e desafios diários. Isso pode ser feito de diversas formas, vou citar três delas abaixo:
- Conexões emocionais: nada mais humano do que o sentimento de empatia. Podemos trazer isso para o ambiente corporativo ao produzir conteúdos que refletem as mais diferentes realidades dos colaboradores, com exemplos cotidianos.
- Desaceleração deliberada: promover conteúdos que desenvolvem os colaboradores, construindo narrativas mais profundas que incentivem pausas e reflexões e ajudem a combater o consumo rápido de informações irrelevantes.
- Histórias contínuas: em vez de mensagens pontuais e desconectadas, desenvolver narrativas que sigam uma lógica de temporadas dentro de uma série, que evoluem ao longo do tempo criando um senso de expectativa e promovendo um engajamento maior.
Essas e outras técnicas de uso do storytelling adaptado à comunicação organizacional são aprofundadas no curso livre Storytelling aplicado às demandas da comunicação interna, oferecido pela Faculdade Cásper. Saiba mais detalhes sobre essa formação aqui.
O Futuro da Comunicação Interna na Era da Desatenção
Enfrentar a Era da Desatenção e a Cultura da Superficialidade é um desafio não apenas contra o tédio, mas contra um comportamento de consumo totalmente disseminado na atualidade. E nada melhor do que retornar às origens do ser humano para combater essa prática que empobrece o ambiente corporativo.
Dos tempos das cavernas à era da inteligência artificial, uma coisa permanece igual: vamos continuar ouvindo e contando histórias. Então precisamos saber utilizar as técnicas de storytelling para construir narrativas envolventes, que incentivem a reflexão para não só combater os efeitos negativos do consumo digital raso e rápido, como também criar uma comunicação interna mais profunda e significativa.
Investir em storytelling é, portanto, uma necessidade para qualquer organização que deseja manter seus colaboradores engajados e bem-informados, navegando com sucesso em um ambiente saturado de informações e distrações.
*Gustavo Teitelbaum – ministra o curso de Storytelling aplicado às demandas da comunicação interna na Faculdade Cásper Libero. Formado em Comunicação Social pela PUCRS, com MBA na FGV EAESP e cursos de especialização em Empreendedorismo na Universidade de Babson/US e Tecnologia Criativa pela Miami Ad School Brasil.
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